Introdução
No início de outubro de 2025, a Unimed – uma das maiores cooperativas de saúde do Brasil – foi alvo de um ataque cibernético de grande escala. O grupo hacker conhecido como Sarcoma assumiu a autoria do incidente, afirmando ter invadido os sistemas da organização e extraído aproximadamente 2,8 terabytes de dados em formato de arquivos SQL. Entre as informações supostamente comprometidas estão bancos de dados com registros internos e até documentos pessoais de clientes – evidenciado por uma imagem de documento de identidade vazada pelos invasores nas redes sociais. O ataque veio na esteira de incidentes anteriores contra a cooperativa e trouxe novamente à tona preocupações sobre a segurança da informação na área da saúde.
Segundo relatos iniciais divulgados por perfis especializados como Hackmanac no X (antigo Twitter), o método utilizado teria sido um ransomware, tipo de malware que sequestra digitalmente os sistemas da vítima. Nesse tipo de ataque, os arquivos nos servidores infectados são criptografados, bloqueando acesso a sistemas, documentos e dados, enquanto os criminosos exigem pagamento de resgate para restaurar o acesso. Além da interrupção potencial dos serviços, houve a denúncia de que um volumoso conjunto de dados confidenciais da Unimed foi exfiltrado pelos hackers – algo particularmente grave se considerado o porte da cooperativa, que atende mais de 18 milhões de beneficiários em todo o país e opera uma vasta infraestrutura de hospitais, laboratórios e clínicas.
Quando ocorreu o incidente? De acordo com informações oficiais, a investida criminosa foi identificada na primeira semana de outubro de 2025. Em 5 de outubro, a Unimed Federação Rio Grande do Sul comunicou ter sido alvo de um ataque cibernético, acionando imediatamente protocolos de contenção e segurança. Poucos dias depois, as notícias sobre o vazamento massivo de dados ganharam repercussão nacional, levando a Unimed do Brasil – entidade que representa a marca nacionalmente – a se pronunciar sobre o caso. A empresa, até o momento, nega ter ocorrido comprometimento significativo de seus sistemas centrais ou interrupção de serviços, embora confirme que suas equipes de TI estão investigando a origem e veracidade do suposto vazamento. Em nota, a Unimed esclareceu que o sistema cooperativo é formado por diversas unidades autônomas (cada uma com infraestrutura própria) e que um incidente localizado não necessariamente afeta toda a rede nacional. Ou seja, ainda que um núcleo regional tenha sido atacado, os dados e operações das demais cooperativas poderiam permanecer seguros, graças à separação estrutural. Apesar da negativa oficial de vazamento, a própria confirmação do ataque e o volume de dados alegadamente sob posse dos criminosos geraram preocupação generalizada. Especialistas alertam que, mesmo sem uma comprovação independente imediata, o incidente deve ser encarado com seriedade e transparência, dadas as possíveis implicações legais (como a notificação obrigatória à ANPD – Autoridade Nacional de Proteção de Dados) e riscos à privacidade dos pacientes.
Nesta introdução, contextualizamos o que ocorreu no ataque recente à Unimed: quem o perpetrou, quando aconteceu e quais dados podem ter sido expostos. Nos tópicos a seguir, exploraremos mais detalhadamente a parte técnica do ataque, discutiremos as falhas de segurança envolvidas e os perigos de se negligenciar a proteção de dados no ambiente corporativo interno. Também abordaremos exemplos reais de consequências enfrentadas por empresas em situações similares – desde interrupções de serviço até pesadas sanções previstas na LGPD – e apresentaremos boas práticas que profissionais de TI podem adotar para evitar brechas desse tipo.
Detalhes técnicos do ataque e falhas exploradas
Do ponto de vista técnico, o incidente da Unimed aparenta combinar duas graves ameaças: o ransomware em si, que criptografa sistemas e demanda resgate, e o vazamento de dados confidenciais (data breach), indicando que os invasores adotaram uma tática de dupla extorsão. Conforme mencionado, o grupo Sarcoma reivindicou a autoria do ataque, e fontes ligadas à investigação indicaram que a cooperativa foi alvo de um malware de ransomware implantado em sua rede interna. Isso sugere que os criminosos não apenas bloquearam o acesso aos sistemas, como também exfiltraram uma cópia dos dados internos – uma estratégia comum para pressionar a vítima a pagar, sob ameaça de publicar informações sensíveis caso o resgate não seja efetuado.
Quais poderiam ser os vetores de entrada? Ainda não há confirmação oficial de como os atacantes penetraram na rede da Unimed, mas experiências anteriores apontam algumas possibilidades. Phishing e engenharia social são vetores frequentes – um funcionário desavisado pode ter sido induzido a clicar em um link malicioso ou abrir um anexo infectado, permitindo o acesso inicial dos invasores. Credenciais vazadas ou fracas também poderiam ter sido exploradas para acesso remoto indevido a servidores (via RDP/VPN). Outra hipótese forte é a exploração de vulnerabilidades em sistemas expostos: no setor de saúde, sistemas legados ou mal configurados muitas vezes ficam acessíveis além do que deveriam.
De fato, alguns meses antes, foi descoberta uma falha grave de segurança nos sistemas internos da Unimed que serve de exemplo alarmante. Em março de 2025, pesquisadores identificaram que uma instância do serviço de streaming de dados Apache Kafka vinculada à Unimed estava publicamente exposta na internet, sem nenhuma autenticação ou controle de acesso habilitado. Esse ambiente, usado para processar mensagens em tempo real (inclusive um chatbot chamado “Sara”), permaneceu aberto de 24 de março a 7 de abril e permitia que qualquer pessoa com conhecimentos técnicos interceptasse e visualizasse comunicações internas sensíveis. Estima-se que mais de 14 milhões de mensagens transitaram nesse período vulnerável, muitas contendo dados confidenciais de saúde, como sintomas descritos por pacientes, solicitações de exames, imagens médicas e documentos pessoais. Em outras palavras, uma porta escancarada na rede interna possibilitava espionagem e captura de informações altamente sensíveis, tudo devido a configuração incorreta de segurança.
Não está claro se a brecha de Kafka teve relação direta com o ataque de ransomware atual, mas o caso ilustra as falhas de segurança potencialmente exploráveis. Além dessa, outras vulnerabilidades foram reportadas por grupos como o WhiteHat Brasil, que apontaram “várias falhas de segurança em inúmeras unidades da Unimed” pelo país. Essas falhas expuseram fichas cadastrais completas de pacientes (nome, CPF, dados de dependentes, etc.), logins médicos, e-mails internos, imagens de sistemas hospitalares, planilhas financeiras e até exames, certidões de óbito e raios X. Segundo o grupo, a falha permaneceu explorada por cerca de um mês em diversos municípios (Teresina, Imperatriz, Parnaíba, São Leopoldo, entre outros) e poderia estar afetando milhões de pessoas. Embora nesse caso a denúncia tenha vindo de pesquisadores éticos e não de criminosos, fica evidente como brechas na rede interna – seja um servidor sem proteção, seja uma aplicação desatualizada – podem servir de porta de entrada ou facilitar a movimentação dos atacantes uma vez dentro do perímetro corporativo.
Resumo técnico do ataque: O incidente envolvendo a Unimed foi classificado como um ataque de ransomware com possível vazamento de dados. Isso indica que houve comprometimento de sistemas internos, provavelmente através de alguma porta de entrada negligenciada (phishing, credenciais comprometidas ou falha técnica explorada). Uma vez dentro, os agentes maliciosos conseguiram movimentar-se lateralmente pela rede corporativa, coletando grandes volumes de informações (2,8 TB, segundo a alegação) e finalmente desencadeando a criptografia dos servidores. A falta de segmentação robusta da rede interna ou de monitoramento adequado pode ter contribuído para que os invasores acessassem diversos bancos de dados e sistemas sem serem detidos rapidamente. Vale notar que a Unimed, em seu comunicado, afirmou que seus sistemas principais não foram comprometidos e que nenhum dado sensível de pacientes foi confirmado como vazado até então. Entretanto, a simples possibilidade de exposição de dados sigilosos (como documentos de identidade e informações de saúde) já configura um incidente crítico de segurança e aciona todos os alertas de conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
O perigo de negligenciar a segurança interna de dados
Este caso serve como um duro lembrete dos riscos de se negligenciar a segurança da informação no ambiente interno corporativo. Muitas empresas investem fortemente em firewalls de perímetro, antivírus e outras soluções de borda, mas baixam a guarda dentro da rede interna, presumindo que ali o ambiente seja seguro por padrão. A experiência demonstra que essa suposição é perigosa. Uma vez que um atacante ultrapassa as defesas externas e obtém acesso à rede interna, ele pode encontrar um verdadeiro parque de diversões se a organização não implementou controles rígidos também internamente.
No incidente da Unimed, percebe-se que erros básicos de configuração e falta de controles internos robustos foram fatores-chave. Como mencionado, havia sistema crítico sem autenticação habilitada, assim como dados sensíveis trafegando sem proteção adequada. Tais falhas não requerem técnicas avançadas de hackers para serem exploradas – muitas vezes basta um scanner ou conhecimento público de portas abertas para que criminosos ou curiosos acessem informações privadas. Em outras palavras, falhas de segurança não precisam de um ciberataque sofisticado para causar estragos; frequentemente são resultado de negligência em configurações básicas. Servidores mal configurados, ausência de autenticação e ambientes internos expostos indevidamente são pontos críticos que colocam milhões de registros em risco.
Negligenciar a segurança de dados internos é especialmente grave em setores como o de saúde, onde as empresas lidam com informações altamente sensíveis (histórico médico, dados pessoais, resultados de exames). Quando esses dados são expostos, os danos podem ser irreparáveis à privacidade e à dignidade dos pacientes, rompendo a confiança que eles depositam na instituição. No caso da Unimed, por exemplo, mesmo diante da alegação de que “nenhum dado sensível vazou”, a simples notícia de que mensagens entre pacientes e médicos ficaram acessíveis a estranhos já gera abalo na relação de confiança. Imagine um paciente que confidenciou seus sintomas ou dúvidas esperando sigilo, e depois descobre que essas conversas circularam fora do ambiente seguro – o impacto reputacional para a empresa é enorme.
Além da perda de confiança, ignorar a segurança preventiva interna pode implicar sérias consequências legais e financeiras. A LGPD, em vigor desde 2020, estabelece obrigações claras para proteção de dados pessoais, especialmente os sensíveis. O artigo 46 da LGPD determina que empresas devem adotar medidas técnicas e administrativas aptas a proteger os dados pessoais contra acessos não autorizados ou situações acidentais/ilícitas de vazamento. Caso ocorra um incidente com risco ou dano relevante aos titulares, a organização é obrigada a comunicar prontamente a ANPD e os próprios afetados. Não cumprir essas disposições configura negligência, sujeitando a empresa a sanções. No contexto do ataque à Unimed, especialistas já questionam se a cooperativa falhou em algumas dessas obrigações – houve análise sugerindo que a Unimed pode ter sido negligente em garantir a segurança de um fornecedor (no caso, a plataforma Kafka) conforme exige o artigo 39 da LGPD, que trata da responsabilidade do controlador em orientar e fiscalizar operadores de dados. Ou seja, mesmo que a empresa alegue que os dados de saúde em si não estavam naquele ambiente, ela ainda poderia ser responsabilizada por configuração inadequada e falta de diligência na proteção das informações.
Em suma, o perigo de negligenciar a segurança interna reside no fato de que qualquer brecha pode ser explorada e ter efeitos catastróficos. Os criminosos cibernéticos estão constantemente procurando o elo mais fraco – e falhas escondidas dentro da rede, sem monitoramento, sem segmentação ou sem políticas de acesso restritivas, acabam se tornando alvos fáceis. Para organizações de todos os portes (mas principalmente as que lidam com dados sensíveis), não há mais distinção entre “dentro” e “fora” da rede: os conceitos de segurança zero trust partem do princípio de que nenhuma parte do ambiente deve ser automaticamente confiável. Ignorar essa filosofia é comprometer não apenas a conformidade legal, mas também a própria continuidade do negócio e a reputação construída junto aos clientes.
Consequências de falhas na proteção de dados internos
Empresas que falham em proteger sua rede interna e os dados ali contidos estão sujeitas a diversas consequências severas, que vão além do prejuízo imediato causado por um ataque. No caso da Unimed e de outras organizações vítimas de incidentes semelhantes, podemos citar exemplos concretos de impactos negativos:
- Paralisação de operações e perda de produtividade: Um ataque ransomware ou outro incidente de segurança pode derrubar sistemas críticos por horas ou dias, interrompendo completamente serviços essenciais. Na Unimed Brusque (SC), por exemplo, um ataque cibernético em 2025 causou instabilidade generalizada nos sistemas internos, afetando os canais de atendimento, agendamento de consultas e autorizações de exames. Durante o incidente, a cooperativa precisou recorrer a meios alternativos (WhatsApp, números 0800) para manter o atendimento aos pacientes. Essa paralisação não só gera transtornos aos clientes, como também acarreta prejuízos financeiros diretos (consultas canceladas, produtividade perdida) e custos extras de recuperação de sistemas. Em setores como saúde, ainda existe o risco de impacto à vida humana – exames e procedimentos podem ser atrasados, causando potenciais danos aos pacientes.
- Exposição de dados sensíveis e implicações legais (LGPD): Vazamentos de dados pessoais – como informações de pacientes, funcionários ou clientes – podem levar a ações legais e multas pesadas. A LGPD prevê sanções que incluem multas de até 2% do faturamento da empresa, limitadas a R$ 50 milhões por infração, além de possibilidade de suspensão das atividades de tratamento de dados. Embora a ANPD (autoridade reguladora) atue com proporcionalidade, empresas do porte da Unimed, caso confirmem um vazamento massivo de dados de saúde, certamente ficariam sob rigoroso escrutínio. Há também o dever de comunicação e transparência: as organizações devem informar os titulares dos dados afetados e as autoridades competentes, sob pena de agravar as sanções. No âmbito judicial, ações civis de indenização por dano moral coletivo e individual podem ser movidas por clientes lesados. Ou seja, o descuido com a proteção interna de dados pode resultar em um custo financeiro astronômico – somando multas, processos e investimento emergencial em melhorias de segurança após o fato consumado.
- Danos à reputação e perda de confiança: Talvez a consequência de mais longo prazo seja o abalo reputacional. Empresas que sofrem incidentes de segurança ganham as manchetes pelos motivos errados, colocando em xeque a confiança que clientes e parceiros depositam nelas. No setor de saúde, isso é especialmente crítico – pacientes esperam confidencialidade absoluta. O caso Unimed repercutiu na imprensa especializada e geral, gerando manchetes sobre “roubo de 2,8 TB de dados” e “falhas de segurança” associadas à marca. Ainda que a cooperativa tenha negado parte das alegações, a dúvida plantada na opinião pública pode levar tempo para ser dissipada. Especialistas apontam que incidentes assim comprometem diretamente a relação de confiança entre pacientes e instituições de saúde. Essa quebra de confiança pode se traduzir em perda de clientes, dificuldade em conquistar novos beneficiários e até maior escrutínio por parte de órgãos reguladores e investidores. Reconstruir a reputação após um vazamento pode exigir campanhas de transparência, certificados adicionais de segurança e um esforço intenso de relações públicas – tudo isso consumindo recursos que poderiam ter sido poupados com prevenção adequada.
- Multas e penalidades regulatórias: Além da LGPD, empresas de certos setores podem enfrentar sanções de agências reguladoras específicas. Operadoras de saúde como a Unimed estão sujeitas à ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), que pode intervir se a continuidade do atendimento for comprometida. Outros setores têm órgãos próprios (como Banco Central para bancos, etc.) que também aplicam punições em caso de falhas de segurança. No exterior, incidentes de segurança podem inclusive barrar operações internacionais devido a leis como GDPR europeia. Em resumo, a empresa negligente pode ficar enredada em investigações multi-agência, termos de ajustamento de conduta e necessidade de se adequar sob supervisão rigorosa, o que consome tempo da alta gestão e desvia foco do core business.
- Custos de resposta e recuperação: Por fim, vale lembrar dos custos técnicos para remediar um ataque bem-sucedido. Restaurar sistemas do zero usando backups (isso se os backups não foram também cifrados pelo ransomware), contratar empresas de resposta a incidentes, realizar auditorias de segurança pós-ataque e investir em novas ferramentas e treinamento emergenciais – tudo isso são despesas significativas. No caso de ataques ransomware, algumas empresas ainda optam (não recomendavelmente) por pagar o resgate para tentar reaver dados, o que alimenta ainda mais o ciclo do cibercrime e não garante a restituição completa. Em suma, sair do buraco após um incidente pode custar muito mais caro do que investir proativamente em prevenção.
Em face dessas consequências, fica claro que falhar na proteção interna não é uma economia de esforço, e sim um risco existencial para a organização. Empresas que aprendem da pior forma podem sofrer impactos irreversíveis, enquanto aquelas que antecipam essas lições fortalecem-se como referências em segurança e confiabilidade.
Boas práticas para evitar brechas na rede interna
Diante dos riscos expostos, o que os profissionais de TI podem fazer para evitar que um incidente como o da Unimed ocorra em suas empresas? A seguir, listamos boas práticas essenciais de segurança cibernética focadas na proteção da rede interna e dos dados corporativos, com explicação de cada ponto:
- Segmentação de rede: Implemente a divisão da rede corporativa em segmentos menores e isolados. Isso limita drasticamente a capacidade de um invasor se movimentar lateralmente caso ele comprometa um ponto da rede. Por exemplo, a rede de computadores dos funcionários não deve ter acesso irrestrito ao segmento onde estão os servidores de banco de dados críticos. Use VLANs, sub-redes separadas e firewalls internos para controlar o tráfego entre os segmentos. Assim, mesmo que um dispositivo seja infectado, o malware encontrará “paredes” impedindo seu acesso a outros sistemas, confinando o dano.
- Controle de acesso e privilégio mínimo: Adote o princípio do menor privilégio em todo o ambiente. Cada usuário, sistema ou processo deve ter apenas as permissões estritamente necessárias para realizar suas funções – nada além disso. Revise regularmente as contas com acesso administrativo e restrinja-as ao mínimo de pessoas. Implemente gestão de acessos privilegiados (PAM) para controlar e auditar sessões de administradores. Além disso, utilize autenticação multifator (MFA) para acesso a sistemas sensíveis, inclusive na rede interna, dificultando que invasores usem credenciais roubadas. Lembre-se de controlar também o acesso de terceiros e fornecedores: conexões de suporte remoto devem ser bem gerenciadas e desativadas quando não necessárias.
- Monitoramento contínuo e detecção de intrusões: Tenha visibilidade do que ocorre dentro da sua rede. Ferramentas de monitoramento de tráfego e sistemas de detecção de intrusão (IDS/IPS) podem alertar para comportamentos anômalos, como um usuário baixando repentinamente grande volume de dados ou acessando sistemas que nunca acessou. Soluções de SIEM (Security Information and Event Management) agregam logs de diversos dispositivos e aplicam inteligência para identificar possíveis ameaças em tempo real. No caso de um ransomware, por exemplo, atividades incomuns de criptografia de arquivos podem ser detectadas precocemente. Monitorar não é opcional – é a única forma de reagir rápido antes que uma brecha se torne um desastre. Equipe seu centro de operações de segurança (SOC), interno ou terceirizado, com profissionais capazes de investigar alertas e responder prontamente a incidentes.
- Backups frequentes e planos de recuperação: Mantenha rotinas robustas de backup de todos os dados e sistemas críticos. Os backups devem ser frequentes (diários ou até horários, conforme a criticidade dos dados) e armazenados fora da rede principal, de preferência em mídias ou locais isolados que não possam ser acessados diretamente pelos mesmos credenciais da rede (para evitar que um ransomware apague ou criptografe os backups). Teste periodicamente a restauração desses backups para garantir que funcionem quando precisarem ser usados. Além disso, desenvolva um Plano de Recuperação de Desastres (DRP) e um Plano de Continuidade de Negócios (BCP) que contemplem cenários de ciberataque – por exemplo, definindo como a empresa operaria caso sistemas fiquem fora do ar por vários dias. No incidente da Unimed, aqueles que dispunham de contatos alternativos (WhatsApp, 0800) conseguiram manter atendimento, o que mostra a importância de ter alternativas manuais ou offline para serviços essenciais.
- Conscientização e treinamento interno: Tecnologia nenhuma substitui a consciência de segurança dos colaboradores. Invista em programas periódicos de treinamento sobre cibersegurança, englobando boas práticas de uso do e-mail, identificação de tentativas de phishing, manuseio seguro de informações e dispositivos, e políticas da empresa quanto a segurança. Simule testes de phishing internos para avaliar e educar os funcionários de forma prática. No caso de instituições de saúde, inclua todos os níveis – do pessoal administrativo a médicos e equipes de suporte – pois um descuido de qualquer um pode abrir brecha para atacantes. Crie uma cultura na qual todos se sintam responsáveis pela segurança e saibam como agir diante de situações suspeitas (por exemplo, reportar imediatamente um e-mail estranho à TI). A conscientização é a primeira linha de defesa; funcionários alertas podem impedir muitos ataques antes mesmo que ferramentas técnicas entrem em ação.
- Manutenção e atualização constantes: Mantenha todos os sistemas e softwares atualizados com os patches de segurança mais recentes. Vulnerabilidades conhecidas são como portas destrancadas – basta o criminoso girar a maçaneta. Tenha um processo de gerenciamento de patches para aplicar atualizações em servidores, estações, dispositivos de rede e aplicações assim que possível, especialmente aquelas críticas. Onde for inviável aplicar patches imediatamente (por questões operacionais), avalie implementar mitigações temporárias ou segmentar/isoladar o sistema vulnerável até a correção. Inclua também nesse tópico a atualização de políticas e procedimentos de segurança: revise suas políticas internas periodicamente à luz de novas ameaças e lições aprendidas em incidentes (internos ou externos). A adaptação constante é parte essencial da cibersegurança, dado que os atacantes estão sempre inovando suas técnicas.
- Testes de segurança e auditorias regulares: Não espere que um invasor descubra suas falhas – antecipe-se descobrindo-as você mesmo. Conduza pentests (testes de invasão) periódicos em sua infraestrutura, incluindo simulações de ataque interno. Avalie também a segurança dos sistemas dos cooperados ou filiais (no caso de uma estrutura semelhante à da Unimed) para garantir que uma unidade com proteção mais fraca não acabe servindo de porta de entrada para toda a rede. Realize auditorias de conformidade para checar aderência à LGPD e outras normas, bem como análises de risco que identifiquem onde estão seus pontos mais críticos. Os resultados desses testes devem embasar planos de melhoria contínua. Lembre: segurança da informação é um processo cíclico, não um produto estático.
Adotar as práticas acima não garante risco zero – nenhuma medida isolada garante –, mas eleva sobremaneira o nível de proteção da empresa. No contexto de uma cooperativa de saúde, por exemplo, se houvesse políticas rígidas de segmentação e monitoramento, talvez o grupo Sarcoma não tivesse conseguido extrair 2,8 TB de dados sem detecção. Se vulnerabilidades internas tivessem sido corrigidas prontamente, talvez não houvesse falhas abertas por onde espiar milhões de mensagens. A combinação de medidas preventivas tecnológicas e cultura de segurança é o caminho mais efetivo para minimizar a superfície de ataque e evitar que a próxima manchete de vazamento tenha o nome da sua empresa.
Conclusão
O incidente de segurança envolvendo a Unimed deixa claras duas lições fundamentais. Primeiro: a segurança preventiva é indispensável – investir em proteção antes que o desastre aconteça é muito mais eficaz (e barato) do que lidar com as consequências de um ataque bem-sucedido. Segundo: a cibersegurança é um processo contínuo, que exige atualização constante de políticas, tecnologias e práticas para acompanhar a evolução das ameaças. Não basta implementar controles uma vez e “relaxar”; é preciso revisar, testar e aprimorar regularmente a postura de segurança.
A área de saúde, em particular, tornou-se um alvo prioritário do cibercrime global devido ao enorme impacto que sua paralisação ou exposição de dados pode causar. Mas essa realidade se estende a todos os setores: nenhuma empresa que dependa de sistemas digitais está imune. Segurança da informação deve ser tratada como pilar estratégico do negócio, e não um tema apenas técnico. Como bem colocou uma análise sobre o caso Unimed, proteger dados não é mais um diferencial competitivo, e sim uma obrigação ética e estratégica para manter a confiança do público e a continuidade das operações. Governança sólida, controles técnicos bem implementados, capacidade de resposta a incidentes e uma cultura organizacional focada em proteção de dados precisam estar no centro das estratégias corporativas.
No desfecho do caso Unimed, independentemente de confirmarem-se ou não todas as alegações de vazamento, o episódio já serviu como um alerta contundente. Empresas em todo o Brasil estão olhando para suas próprias defesas e se perguntando: “E se fosse conosco?”. A resposta adequada a essa pergunta é agir proativamente: corrigir falhas conhecidas, reforçar os pontos fracos, treinar pessoas e simular cenários adversos. Se a sua organização ainda não o fez, o momento é agora – antes que um agente mal-intencionado encontre a brecha que você deixou passar.
Em suma, a trajetória da Unimed pós-incidente provavelmente envolverá investimentos e melhorias para recuperar terreno e confiança. Que isso sirva de exemplo para o restante do mercado: não espere pelo próximo ataque para dar à segurança da informação a prioridade máxima que ela merece. A prevenção, aliada à vigilância contínua, é a única forma de garantir que incidentes cibernéticos sejam evitados ou, na pior das hipóteses, rapidamente contidos, protegendo tanto os negócios quanto as pessoas cujos dados foram confiados à empresa. Segurança digital é um jogo sem linha de chegada – exige esforço constante, mas os profissionais de TI bem preparados e conscientizados terão sempre melhores condições de manter os atacantes do lado de fora e a confiança dos clientes lá dentro.
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